
FILOSOFIA OCULTA

A ARTE DOS MAGI
A Magia & os Ritos de Iniciação dos Sacerdotes Persas

A palavra magia, em última análise, deriva da raiz indo-europeia subjacente ao termo iraniano magû, utilizado para se referir a uma classe sacerdotal de homens preparados através do estudo, portanto, letrados e iniciados na ciência e arte de forjar conexões espirituais verdadeiras entre os planos material e espiritual. Esta ciência e arte na qual estes sacerdotes eram iniciados era poderosa e efetiva, sendo ela o que hoje conhecemos como magia. Infelizmente, muito da sabedoria destes sábios persas foi perdida com o tempo, pelo menos para grande maioria dos magos ocidentais da tradição moderna. Em sua obra, De Mysteriis, Jâmblico se esquiva de utilizar o termo mageia ou magoi; sua intenção era preservar o prestígio sacerdotal e teúrgico que essas palavras detinham em sua época, por volta dos Sécs. III e IV d.C. Ele destaca a diferença entre teurgia, uma arte sacerdotal, e goēteia, a arte da feitiçaria. Preservando o termo magia, Jâmblico pretendia equipara-lo com o significado sacerdotal da teurgia que ele defendia. Isso porque a forma original pela qual os sacerdotes e magos persas, os magi, compreendiam a magia é que se tratava de uma ferramenta para o desenvolvimento pessoal e autoconhecimento, quer dizer, iniciação; no entanto, eles também aplicavam magia para superar os obstáculos naturais do mundo ou aqueles criados pelo homem.
O objetivo fundamental da magia para os magos da Pérsia era ushta, coletiva ou individual. Essa é uma palavra avéstica que significa felicidade. Nas mãos de nãoiniciados, a magia torna-se apenas feitiçaria, neste caso, a aplicação de técnicas magísticas para resolução única de dificuldades temporais e transitórias na vida. Os mazdeístas de forma geral deploram a feitiçaria em detrimento da magia. Jâmblico sustenta a mesma posição, destacando a teurgia em detrimento da goécia. Nós estudamos esse tema com detalhes nas lições do Curso de Filosofia Oculta (1 & 2).
Para os antigos iranianos, descendentes de famílias da cultura indo-europeia, havia pouca distinção entre magia e religião. Sua cultura era mágico-religiosa e os aderentes dela hoje, os modernos zoroastristas, preservam essa cosmovisão. O conhecimento dessa cultura para nós magistas da atualidade é de fundamental interesse teórico e prático, pois nos revela a ciência e arte da magia como compreendida em seus primórdios e, objetivamente, como a magia funciona, como ela é efetiva quando aplicada corretamente na combinação de seus elementos.
Escritores ocultistas letrados e acadêmicos do passado e do presente concordam que o termo magia vem de uma classe de sacerdotes persas/iranianos que praticavam um sistema de teurgia operativa conhecidos como magi (ou magoi). Não ocorre o mesmo com os autores populares e modernistas. Na grande maioria dos livros sobre magia disponíveis no mercado hoje encontramos um hiato na interpretação da magia e suas raízes históricas. Nos tempos de glória do império persa os magi eram representantes de uma escola iniciática de magia que oferecia um tipo de teologia prática baseada na tradição zoroastrista, fundada por um profeta chamado Zaratustra.
A tradição mágico-cultural zoroastrista é a matriz original dos símbolos e fórmulas que hoje utilizamos no que se conveniou chamar de magia cerimonial e ela perdurou no tempo por quase quatro mil anos e suas raízes se aprofundam pelo longínquo passado da cultura indo-europeia. Um vasto arranjo de práticas magísticas foram produzidos por esses magi do passado; algumas delas foram preservadas até os dias de hoje, como a utilização do círculo mágico; outras, no entanto, permaneceram oculta nas brumas do tempo e são desconhecidas por uma legião de magos modernos no Ocidente. Essas técnicas desconhecidas de magia, no entanto, foram transmitidas a cultura védica da Índia, mantidas e professadas pelas comunidades persas/iranianas presentes no subcontinente indiano. Muitas das técnicas da teurgia indiana têm influências profundas dos aspectos ocultos da magia dos persas, o que ficou a parte da magia cerimonial ocidental. Notamos aqui um hiato profundo. Será que estas técnicas de teurgia indiana, fora a metalinguagem e cosmovisão hindu, se aplicam efetivamente a magia cerimonial da Tradição Esotérica Ocidental?[1]
A intenção deste curso derivado do CFO é demonstrar como a teologia prática e sistema de magia dos sacerdotes persas pode ser de fundamental auxílio no exercício da magia. As técnicas destes sacerdotes persas podem ser aplicadas em qualquer sistema mágico com eficiência, aumentando o conhecimento e capacidade magística de magos aprendizes ou adeptos. A escola de magia e iniciação fundada por Zaratustra, a Mazmaga, foi tanto um sistema independente de cosmovisão e metalinguagem mágica, quanto uma fonte de conhecimento magístico que influenciou profundamente as culturas da Ásia Central e escolas iniciáticas diversas como a Irmandade Sarmoung, uma escola esotérica sufi cuja existência foi revelada nos escritos do professor espiritual greco-armênio George Gurdjieff.
Este curso, portanto, se debruça sobre: i. história; ii. teoria mágica; iii. fórmulas de iniciação; iv. magia persa na prática, a aplicação das técnicas de magia dos sacerdotes persas, os magi. Seguiremos, portanto, a estrutura dos módulos de estudo do Curso de Filosofia Oculta. Estudar a história, a teoria mágica de universo e as fórmulas de iniciação de sistemas mágico-religiosos nos dota de capacidade e conhecimento para aplicar suas técnicas individualmente, alinhadas a nossa tradição ou não. Com a história compreendemos o contexto cultural; com a teoria mágica, quer dizer, a natureza dos deuses, do homem e do universo, compreendemos a estrutura do sistema; com as fórmulas de iniciação tanto aprendemos quanto aplicamos o sistema no nosso desenvolvimento pessoal, o que nos capacita a operar magísticamente com ele pois expandimos a consciência em muitos níveis, espiritual, psicológico, ético e intelectual. Para que a magia dentro de um sistema funcione, ele precisa ser plantado profundamente nas camadas da mente, do contrário ele não produz frutos criativos, eficientes e saudáveis. Por conta disso este o curso provê um currículo de prática e exercícios a serem desenvolvidos no curso de doze meses, promovendo o aprofundamento e o desenvolvimento fundamental para aplicação da magia persa. E na medida em que colocamos em prática estes exercícios, os mistérios (râzhâ) da magia persa serão acessados em níveis de compreensão profunda de um magi.
Fernando de Ligório
Filosofia Oculta

NOTA:
[1] Tradições brasileiras de cabala crioula como a Umbanda e Quimbanda, no entanto, resgatam algumas dessas técnicas de teurgia no seu cerimonial magístico. As obras de F. Rivas Neto e de seu mestre, W.W. da Matta e Silva demonstram a conexão entre a cosmovisão umbandista e hinduísta, embora a abordagem dos autores fuja um pouco do contexto histórico da Umbanda e da Quimbanda.